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16 maio 2009


«O Aníbal é só o meu eterno grande amigo e camarada. Ainda hoje tenho a sensação que
nasci com ele. Sempre me lembro dele. Sempre trilhámos o mesmo percurso até 1968.
Enquanto vivemos e estudamos no Cubal, partilhámos de tudo o que era possível. Desde a
batota, às fisgadas com grampos, dos matraquilhos ao bilhar, das farras ao cinema. Quando
em 1966 concluímos o 5º ano, acordámos prosseguir a nossa escolaridade no Liceu Nacional
Norton de Matos, em Nova Lisboa, contrariando a tendência natural da fixação de
estudantes cubalenses na cidade de S. Filipe, em Benguela. Se ainda havia aresta a limar,
na cidade do Huambo cimentamos definitivamente a nossa amizade. Na grande cidade,
vivíamos próximo um do outro. Como companheiros de turma, tínhamos as mesmas
obrigações escolares, consequentemente tornamo-nos quase inseparáveis. Era o pião e a
baraça. Todas as tardes, lá vinha o Aníbal do bairro do CFB, para o Hotel Turismo onde
eu estava hospedado. No meu quarto preparávamos as lições para o dia seguinte. Se
houvesse muita matéria para estudar – época de pontos -, fazíamos semi-directas e era
vulgar, o meu amigo, pernoitar nos meus aposentos. Nos intervalos dos estudos, que
concedíamos para descanso, vinha sempre “à baila” a “maralha” do Cubal. Falar de uns
e de outros, relembrar pequenas histórias e partidas, era um método utilizado para
ultrapassar a nostalgia da nossa terra e a saudade da nossa gente. Era um recarregar de
baterias. Lembro que ele citava com frequência o nome do Sampaio e do Nuno, pelos
quais sentia um carinho especial.
.
As nossas deslocações ao Cubal, no “mala”, ou no “cama-couve”, ou de boleia, eram frequentes. Presenças no “Ruacaná”, eram constantes.
Nas nossas deambulações, o Aníbal usufruía de um hábito: fazia-se acompanhar amiúde pelo “book” de filosofia do Bonifácio. A filosofia era, para
ele, uma paixão. Um dia numa aula, o professor da cadeira, a quem chamávamos de Caneco, por ser de origem indiana, perguntou-lhe:
- Qual o pensador que mais admira?
- Sócrates, Sr. Professor – disse lacónicamente.
- Porquê essa convicção? - questionou o docente.
- Porque o resto é paisagem, Sr. Professor - respondeu peremptório.
Perante a risada geral, o professor, meio embasbacado com a rapidez e firmeza da resposta, apelidou-o, desde logo, como “O Discípulo de
Sócrates “. Daí a oficialização da alcunha de “Sócrates”.
.
José Lemos

Cubalenses

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Família Faria
2.
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Colégio Eça de Queirós

25 janeiro 2009

UM DIA...

UM DIA...
Um dia, algures no futuro
Vou colocar um bouquet de flores
Flutuando nas águas do nosso rio.
É garantido que o farei, juro
Vermelhas, amarelas, de todas as cores
Vê-las-ei afastar-se, terei um arrepio.
Recordarei todos os peixes que pesquei
Todos os jacarés repousando na água
Todas as aventuras em que me envolvi.
Recordarei todos os amigos com quem andei
Todas as mulheres, sem qualquer mágoa
Recordarei toda a vida que então vivi.
Depois, calmamente regresso ao Cubal
Não acreditando ainda, que voltei.
Cruzam-se comigo, fantasmas do passado
Cada esquina, cada casa, cada quintal
Murmuram histórias que já contei
Ainda assim, permaneço sereno, calado
À minha volta, há um silêncio quente
E o sol desce lentamente, vermelho
Espalhando sombras sobre os imbondeiros
A saudade invade-me, sempre crescente
E sinto-me agora terrivelmente velho
Só, sem nenhum dos meus companheiros
Ficarei algum tempo, ainda
Olhando em redor, vendo o tempo recuar
Adiando a inevitável despedida.
Um último olhar à minha terra linda.
Finalmente, voltarei as costas, devagar.
Rumo ao que resta da minha vida.
Um dia
Vou colocar um bouquet de flores.

Henrique Faria

14 janeiro 2009

REGRESSO

Não me importo de dar a minha opinião muito pessoal, sobre o meu regresso à minha terra.
Fui a primeira vez e desde aí tenho ido regularmente. Para quê passar férias em destinos turisticos estranhos, se o posso fazer na minha terra? Acresce o facto de toda a gente falar a mesma lingua.
No entanto não é isto que a Adelaide quer saber!
A minha terra continua na mesma. Os mesmos vetustos imbondeiros, a mesma cadência de cores, o dourado das anharas sem fim, as chuvadas torrenciais e magníficas, o mesmo pôr do sol mágico no risco do horizonte. É, a minha terra continua na mesma. O mesmo mar de águas tranquilas e quentes, os mesmos maboques e mangas, as mesmas goiabas e mamões, as mesmas massarocas assadas deixando um perfume no ar.
No entanto continuo a achar que não é isto que a Adelaide quer saber!
A minha terra continua na mesma. Um povo afável, que me tratou bem por onde passei, que nunca me perguntou se eu era estrangeiro ou "pula", que me tratou sempre de igual para igual.
As nossas cidades e em particular o Cubal, estão mais gastas por tantos anos de guerra, mas isso verdadeiramente importa-me pouco, face à importância de tudo o resto, porque tudo é recuperável com tempo e paciência.
Posso ser assaltado em Luanda, roubado no Lobito, posso ser insultado em qualquer sítio, mas verdadeiramente é muito mais perigoso, visitar S. Paulo ou o Rio de Janeiro ou Nova Iorque ou Pequim, ou Amsterdão.
Acho que era isto que a Adelaide queria saber!
O meu conselho é que toda a gente deve cumprir os seus sonhos sem medo de desilusões. Um dia, havemos de subir, como se diz na nossa terra e, nessa altura nenhum sonho já será possível.
Um abraço
Henrique

27 dezembro 2008

ÁFRICA


ÁFRICA
Nas savanas poeirentas da infância,
correm os ventos agrestes da memória.
Cavalgando o seu dorso, chegam-me
cores, sons, neblinas, aromas.
E a minha pele agita-se, dilacera-se
em rasgos profundos. Vejo…
Povos negros, caminhando,
cruzando-se, em rumos incertos.
A vida e a morte espreitam,
em cada momento fugidio.
Mas África, minha mãe,
espera serena, paciente,
um tempo novo.

Henrique Faria

É, é assim, sempre que avisto o Tejo....


É, é assim, sempre que avisto o Tejo, não sei, há um batel de nostalgia que se acosta a mim e só a muito custo me desampara. E se lhe soltar as amarras leva-me, perdido, feito Nau Catrineta, pelos sulcos ( agora ) doridos do Atlântico e larga-me pela certa, numa das praias da África Ocidental Portuguesa ( não me recrimines, deixa-me dizer assim. Sabe-me bem, sabes?). E, estranho, esse desconsolo, essa melancolia agasalha-me a alma.
Manuel Sampaio

16 novembro 2008

IMBONDEIRO

O imbondeiro é um ser já moribundo,
Gigante preso em apertados laços,
Tronco rasgado em fissurados traços,
E de raizes mergulhando fundo.
Tem flores brancas, de um alvor profundo,
E longos frutos descorados, baços,
E os seus ramos semelhando braços,
Dizem raivosos um adeus ao mundo.
Como uma raça pecadora e má,
As suas flores não possuem já,
A força viva que germina o fruto.
É como um homem que já nada tem;
Perdeu seus filhos, sua esposa e mãe,
E arrasta em vida o seu próprio luto.
.
Cubal, 1962
Aurelino Faria.



30 outubro 2008

SAUDADE


SAUDADE

Que estado de confusão
Provoca este sentimento
Que é a Saudade.
Diz quem sabe
Que a dita
É bem portuguesa
E sendo eu meia-meia
Tinha a lusa-meia
Talvez, por avareza
Nadar em tamanha graça.
Por feliz acaso
Se juntou a outros meios
Meios-meios de coração
Outros tantos por adopção
E , enquanto a afro-meia
De emoção se esvaziou
A outra meia transbordou...
E agora...
Que dirão os doutores?
Que a saudade sucumbiu!...
Desenganem-se, doutos senhores
Que esta, qual jibóia faminta
Que a vítima esmaga
Inundou as entranhas
Explodiu de recordações
Alimentando a dor.
E essa é tanta, tanta..
No peito e na garganta
Que faz chorar
A saudade...
De Saudade


Mimi Peixoto

10 outubro 2008

Comboio mala

...e também naturalmente continuei a ir ver
o comboio mala, o tal que faz parte do
imaginário de todos nós, pelas mais diversas
razões, que todos têm explicado.
Por mim, já o disse, transportava
mercadorias, passageiros, cavalgava por
terras míticas da minha pátria, lugares que
posteriormente conheci, e que nem por isso
deixaram de ser fantásticos, mas
fundamentalmente transportava os nossos
sonhos.


Henrique Faria