05 janeiro 2011

"Vidas Reais - O seu culto", por Eduardo A. Flórido

Devido à insistência, que considero mesmo esmagadora, de pessoas por quem nutro e continuarei a nutrir grande simpatia, e pelos diversos pedidos que me foram feitos, senti a necessidade de partilhar um conjunto de histórias vividas no passado. Algumas delas testemunhei diretamente, outras observei, mas todas são reais e fidedignas, com o meu testemunho e o de muitos outros (que me desculpem por os expor).

Estas histórias retratam situações caricatas da nossa juventude rebelde, mas autêntica, numa época em que a liberdade era conquistada a qualquer custo, por vezes até com uns golpes de karaté, praticados por cintos já experientes e bem torneados, com os quais eu próprio era presenteado em casa, após algumas das minhas façanhas menos recomendáveis, que eram quase diárias.

Peço desde já desculpa àqueles que irei mencionar, dentro de certos limites, que não prejudicarão a dignidade de ninguém, mas servirão apenas como uma doce lembrança das nossas aventuras de um passado ainda recente, apenas 480 meses (40 anos, meu Deus!). Espero que estas histórias nos façam recordar os tempos passados e comparar com o presente.

Tentarei ser fiel à narração dos acontecimentos, salvaguardando sempre, se necessário, a identidade dos envolvidos, embora acredite que não será preciso. Estas histórias suculentas e agradáveis irão certamente surpreender muitos dos que aqui forem mencionados.

Este espaço será dedicado a: VIDAS REAIS - O SEU CULTO.

Quero dedicar esta primeira HISTÓRIA DE VIDAS REAIS à memória da minha querida e falecida mãe, e a todas as mães do Cubal e de África, especialmente às mulheres negras que, com histórias semelhantes, foram e são grandes mulheres, com uma capacidade de sofrimento pelos seus que me comove profundamente. Ao ver o tratamento que algumas pseudo-madames dão aos seus familiares, sinto ainda mais a falta da minha mãe, que partiu a 29 de dezembro de 2007. Agradeço a Deus por me ter dado uma mãe tão especial, que cumpriu a sua missão na Terra.

Pretendo partilhar mensalmente novas histórias, recordando momentos e lugares do passado. Espero que esta rubrica no blog do meu querido sobrinho Ruca seja do agrado de todos os Cubalenses, e que sirva para recordar momentos inesquecíveis.

P.S. Um cumprimento especial ao Canais e peço desculpa por corrigir uma informação: no jogo contra o Atlético Clube de Portugal, o resultado final foi 5-3 a favor do nosso Recreativo, e não 3-3. Tal como o Canais referiu, perdíamos 0-3 ao intervalo, mas na segunda parte marcámos 5 golos sem sofrer nenhum. Nessa altura, jogava o Baltazar (com quem falei recentemente no seu restaurante), que no ano seguinte ingressou no Sporting. Jogava também o Leitão (genro do Valentim) e a equipa do Atlético era treinada pelo inglês Ted Smith, que ficou impressionado com a exibição do nosso pequeno (na estatura) grande jogador, o negrinho Brinca na Areia (penso que se chamava Quim). A sua exibição foi tão notável que Ted Smith quis levá-lo para Portugal, mas desistiu ao saber que ele tinha 34 anos. Curiosamente, o Atlético venceu todos os jogos em Angola, exceto contra o Cubal, a única equipa africana a derrotar o clube da Tapadinha.

A todos os Cubalenses, votos de um ano de 2011 cheio de coisas boas (ótimas).

Eduardo A. Flórido

Malangatana, o ''imbondeiro da cultura''

África...o Mundo está mais pobre.
Faleceu o artista de excepção! 
Para além da pintura, Malangatana Ngwenya deixou-nos um legado de arte como cerâmica, tapeçaria, gravura e escultura. Foi ainda poeta, actor, dançarino e músico, entre outros.
Aqui fica a nossa homenagem ao "imbondeiro da cultura"




Pensar alto

Pensar alto
Sim
às marrabentas
às danças rituais
que nas madrugadas
criam o frenesi
quando os tambores e as flautas entram a fanfarrar

fanfarrando até o vermelho da madrugada fazer o solo sangrar
em contraste com o verdurar das canções dos pássaros
sobre o já verduzido manto das mangueiras
dos cajueiros prenhes
para em Dezembro seus rebentos
dançarem como mulheres sensualíssimas
em cada ramo do cajual da minha terra
mas, sim ao orgasmo
das mafurreiras
repletas de chiricos
das rolas ciosas pela simbiose que só a natureza sabe oferecer

mas sim
ao som estridente do kulunguana
das donzelas no zig-zague dos ritos
quando as gazelas tão belas
não suportam mais quarenta graus à sombra dos canhueiros em flor

enquanto as oleiras da aldeia, desta grande aldeia Moçambique
amassam o barro dos rios
para o pote feito ser o depositário
de todo o íntimo desse Povo que se não cala disputando
ecoosamente com os tambores do meu ontem antigo.

(Valente Malangatana)