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29 abril 2011

ALMA DE MAR

A minha alma é feita de mar
Desaguando todos os rios
De águas nunca passadas.
É feita de grandes sóis vermelhos
Mergulhando no mar oceano
De pumumos e catuites
E zonguinhas zunindo no ar
Bicos de lacre e siripipis
De milho e massambala
E do chão vermelho
Destilando perfumes alucinados
De massarocas e dendém
De tchinganges levantando poeira
De trovoadas e relâmpagos imensos
E de chuva bravia explodindo na terra
De praias imensas
E ondas traçando alinhavos na areia
De goiabas e mangas e fruta pinha
Derretendo sabores irrrepetíveis
De cubatas e sambos de gado
Amanhecendo em cacimbos serenos
De matas imensas, silenciosas
Onde nos perdemos e encontramos
De imbondeiros solitários
Que sempre me acompanham
Do churrasco de galinha do mato
E bolas de pirão comidas à mão
Escorrendo óleo de palma nos lábios
De rios, de todos os rios
Mesmo os que correm na memória
De iniciações e namoros únicos
Do primeiro beijo às escondidas
De maboques e missangas coloridas
Das argolas enroladas nas pernas
Batucando todos os andares
Marcando ritmos de encanto e vida
De comboios mala furando a noite
Transportando mercadorias e sonhos
A minha alma vagueia nas saudades
Na minha alma vive um país.

Henrique Faria
Coimbra, Dezembro de 2007

23 novembro 2010

CUBAL


Um dia perguntei-lhe
Sabes onde é?
Sabes como é o Cubal?
Não me respondeu, mas
Pegou numa folha de papel
E desenhou.
A verde, uns rabiscos de sisal
Com um lápis preto traçou o rio
Juro que vi os jacarés ao sol
E meninos tremendo de frio
Com o mesmo lápis traçou ao lado
Uma enorme serpente de ferro
Perdendo-se lá longe na mata
Dissolvida num cacimbo nublado.
Com todas as cores que arranjou
Desenhou o casario
E as acácias em flor.
A castanho fez uma estrada para norte
E um pouco à frente, a azul
Desenhou um pontinho
A medo, perguntei um pouco à sorte
Isso parece-me a lagoa.
Claro que é, não há lagoas a sul.
Voltou atrás e desenhou outra estrada
E, um pouco à frente
Numa curva desenhou umas “alminhas”
E logo depois
Fez uma casa que parecia abandonada
Nas árvores em redor, pôs levemente
Muitos bicos de lacre e zonguinhas
A toda a volta do desenho continuou
A rabiscar verde de vários tons
Disse-me
São as matas da tua infância
Onde tantas vezes te perdeste e
Encontraste.
Não me ia esquecer, sabes como sou.
Não vês os catuites e as rolas?
E aquela cabra de leque pastando?
Espera, ainda falta qualquer coisa
E desenhou a azul muito escuro
Nuvens densas e uma chuva bravia
Desculpa, mas não consigo desenhar
O cheiro doce que a terra trazia.
Esse, vais ter que ser tu a imaginar.
Como é possível, ver esse Cubal
Sem nunca lá teres estado?
Enganas-te
Toda a vida vivi rodeada de sisal
Conheci cada palmo nas tuas histórias
Sei de todos, todos os teus amigos
E todos eles vivem como tu
Enredados nas mesmas memórias.

Henrique Faria
Coimbra, Novembro de 2005

O MEU PAÍS

 
Dentro da minha cabeça
Tenho uma caixa de lápis de cor

Com que pinto os sonhos.

Neste

Pego no lápis castanho escuro

E pinto duas muanhas altivas

Que passavam perto de mim.

Dou-lhes mais um pequeno toque

Para que se veja o andar

Que só as gentes do sul têm

E que nós tão bem conhecemos

E para podermos ouvir

Os chocalhos amarrados na canela.

Peguei nos verdes, ah os verdes

E tive que usar todos os tons

Para pintar as matas densas

Passei levemente por cima

O lápis cinzento

Como esquecer-me dos cacimbos

Que tantas vezes me arrepiaram a pele?

Lá ao longe dois morros de basalto

Cortam o horizonte da savana

Pinto-os com o lápis preto.

Com o lápis amarelo dourado

Pinto a imensa anhara

Onde tantas vezes me perdi

E me encontrei.

No meu sonho tinha chovido

Uma chuva bravia, poderosa

Desenhando alinhavos no pano da tarde

E cheirava intensamente

Aquele cheiro da terra depois da chuva

Não o pintei, não consegui

Afinal

De que cor se pinta o cio da terra?

Com o lápis vermelho

Pintei o sol enorme de fim de tarde

E vi no mar

Aquele imenso rasto de sangue

Por fim, com o lápis azul

Sempre o lápis azul

Coloquei no canto direito

A minha assinatura

Esperando, ansiando

Que gostem deste sonho.

Não o vendo, apenas o ofereço

Afinal,

Que preço pode ter um país?
Henrique Faria

13 dezembro 2009

Saudade

Saudade
A saudade é quando te vestes de barco

E sais para um mar que não sei
A saudade solta é um rei
Que troca a gente da terra pela bruma
Como Dom Sebastião
Que muitos vêem
E outros não
A saudade é um caminho sem curvas
Para o infinito

Edgardo Xavier


Publicado no Recanto das Letras em 16/09/2009
Código do texto: T1813276

07 julho 2009

Momentos

Composição: Charles Chaplin/G.Parson/J. Turner

Sorri
Quando a dor te torturar
E a saudade atormentar
Os teus dias tristonhos, vazios
Sorri
Quando tudo terminar
Quando nada mais restar
Do teu sonho encantador
Sorri
Quando o sol perder a luz
E sentires uma cruz
Nos teus ombros cansados, doridos
Sorri
Vai mentindo a tua dor
E ao notar que tu sorris
Todo mundo irá supor
Que és feliz

29 março 2009

Edgardo Xavier e " O Canto da Pedra "

Ontem, Sábado, foi um dia em cheio.
Estive com um amigo de Angola, de Nova Lisboa (Huambo) e também do Cubal. Um amigo poeta. O EDGARDO XAVIER. Lembrar-se-ão certamente da família Xavier do CFB.(vidé post no nosso blog)
A oportunidade deu-se na apresentação do seu novo livro "O Canto da Pedra", da Papiro Editora e que se realizou na Livraria-Galeria Verney em Oeiras.
A sensibilidade que o Edgardo Xavier transfere para a sua poesia, não deixa ninguém indiferente. Já o tinha referido aqui no blog, quando do seu livro de poesia "Amor despenteado".
O Edgardo, autoriza-me a partilha da sua poesia no nosso blog. Escolho este poema, com ilustração de Irene Gomes.

Aqui fica a sugestão de leitura. Não se arrependerão.

TODA A SEDE
................DO MUNDO
...
Fala-me de aventura
De mares a navegar pelo teu corpo
De cheiros fortes e de flores
Dos nossos amores
Diz-me desta procura
Das sedes
Limos
E redes
Que temos para chegar ao infinito

Faço de ti a minha ilha deserta
A minha solidão
Saio para o mistério do tempo
E volto
Sequioso de luz
Para o calor do teu ventre

Cobre de beijos
a minha nudez
Sente-me
com a brasa dos teus olhos
e o fogo esperto
da tua língua
Deixa que morra à míngua
desse céu aberto
e castiga-me
na fúria do teu querer
..
edgardo xavier

Podem ouvir, neste programa, poesia de Edgardo Xavier. clicar em Podcast

Obrigado amigo Edgardo! Parabéns pelo teu trabalho.Uma saudação cubalense.

Ruca

09 março 2008

Intenso

Mais que os lábios
Beijam meus olhos
Quando passeiam por ti
E te acrescentam
Com a beleza dos astros

Como brasa sob cinza
O desejo queima
À revelia do olhar
E acorda-me o corpo
Para um destino
De fogo ou de mar

E sou chama
Luz
Incenso
Ao toque leve
Dos teus dedos
Nas alegrias e nos medos
No beijo breve
E quente
No teu raspar de asa
No teu amar urgente


Edgardo Xavier

10 janeiro 2008

A ALMA DO CUBAL

O Ruca colocou-me um enorme problema ao convidar-me a escrever algo aqui.
Este sítio é mais do que um conjunto de fotos. Do meu ponto de vista é o centro da alma cubalense.
Depois de muito reflectir, resolvi colocar dois poemas nunca mostrados a ninguém. Perceberão porquê.
A duas pessoas que me dizem muito.


ANOITECE
(A meu Pai)

Anoitece
E o céu cobriu-se de mil estrelas
Lá muito longe, entre Rigel e Altair
Encontro aquela que sempre procuro
Nova, com a luz de milhões de velas
Acendeu-se, quando decidiste partir
E brilha intensamente no céu escuro
Anoitece
E quando olho fixamente essa estrela
Sinto que ficou tanto, tanto por dizer
Que nem sei bem por onde começar
Sei que tenho de preencher esta tela
Com cores que te possam dar prazer
Que possam mostrar-te o sol e o luar
Anoitece
Penso em tudo aquilo que me deste
Pitágoras e o milagre da hipotenusa
Arquimedes mergulhando no banho
Sandokan, Cyrano, o princípe Oreste
Neruda, Leonardo e a sua bela musa
Chopin, Galileu, África sem tamanho
Anoitece
Sei que a natureza tem horror ao vazio
Sei que a gravidade nos impede de voar
E que varia na razão inversa da distância
Sei que temos sempre a vida por um fio
Sei que deste tudo o que tinhas para dar
Sei tudo isto que aprendi desde a infância
Anoitece
Deste-me tudo sem pedir nada em troca
Apenas pelo puro prazer de me ver crescer
Ensinaste-me que o sonho comanda a vida
Ensinaste-me a ver que não há fio sem roca
Ainda assim, sinto que ficou tanto por dizer
Tanto, que sinto permanentemente esta ferida
Anoitece
Aproveito para te dizer o que me vai na alma
Que deveria ter dito antes e já não pode ser
A verdade é que só há pouco tempo percebi
Como a luz do teu mundo era doce e calma
E só agora ganhei coragem para te dizer
Que gosto muito, muito, muito de ti.


MEU IRMÃO

De madrugada
A noite ainda cintilava de estrelas
Destacou-se do bando
E voou
Um voo alto, definitivo, sem retorno
Para lá das últimas cordilheiras
E
Acendeu uma candeia no tecto do céu
Mais uma
Junto a tantas outras
Derramando luz no nosso caminho
Recordando quem somos
Ausência
Tantas ausências
Estalam no meu peito
E
A alma quase verga
Na saudade roendo em cada dia
Sonho que voa serenamente noutros bandos
Aproveitando os ventos de feição
Esperando por nós
Um dia, juntos de novo
Voaremos sem pressas
No acolhedor azul infinito.
Um dia...

Henrique